Por Maurício Andrés Ribeiro (*)
“Precisamos reinventar o humano no nível da espécie porque os temas com que estamos envolvidos parecem estar além da competência de nossas tradições culturais atuais, individual ou coletivamente.”
Thomas Berry, em The Great Work
A ciência classifica famílias, gêneros e espécies por suas características biológicas e lhes dá nomes em latim. No caso do ser humano, as propostas de classificação que surgem não se baseiam mais em diferenças biológicas ou genéticas, mas nas qualidades da consciência. A evolução biológica lenta é ultrapassada pela rápida evolução da consciência.
Nossa espécie de homo sapiens sapiens tem capacidade de auto-reflexão e de autoconhecimento.
Quais as imagens e percepções que temos de nós mesmos? Há uma diversidade e infinidade delas, cada qual realçando um aspecto ou característica de nossa consciência e atitude. Fomos designados como homo demens (“O homem é esse animal louco cuja loucura inventou a razão”, disse Cornelius Castoriadis); como o homo moralis, um primata que coopera; o homo sportivus e o homo ludens, pelas características lúdicas, que compartilha com outros animais que jogam e gostam de brincar e fazer humor (Johan Huizinga); o homo bellicus por seu caráter guerreiro; ao desenvolver a tecnologia e a economia somos os homo tecnocraticus e o homo economicus, espécie composta de um conjunto de indivíduos egoístas em busca de gratificação pessoal e acumulação material.
Edgar Morin fala do homo complexus, que lida com a complexidade. Hoje podemos nos ver também como os homo lixus, a única espécie animal que produz lixo: dois milhões de toneladas por dia. E ainda como o homo stressatus, o homem estressado moderno, com as conseqüências que isso traz à sua saúde, ansioso, com medo e preocupado com o futuro e com ameaças reais ou imaginárias.
Ao ocuparmos todo o planeta, nos vemos como homo planetaris; ao viajarmos no espaço, somos os homo cosmicus.
O biólogo Edward O. Wilson assim descreve o homo proteus: “Cultural, flexível, com vasto potencial. Conectado e dirigido pela informação. Move-se, adapta-se, pensa em colonizar o espaço. Lamenta a perda da natureza e espécies, mas esse é o preço do progresso e, de todo modo, isso tem pouco a ver com o futuro”. Alguns transumanistas, que também trabalham com a perspectiva de um ser evolutivo, acenam com o surgimento do homo perfectus que atua por meio do uso ético das tecnologias para estender as capacidades humanas.
A senadora Marina Silva diferencia o homo sapiens global e o local. O Homo sapiens global é refinado, porém vulnerável diante de situações extremas. Do outro lado está “O Homo sapiens local: mais rústico, mais resiliente, mais adaptável à escassez, menos dependente de tecnologia, com conhecimentos associados aos recursos naturais e domínio do saber narrativo: saber escutar, enxergar, fazer. Quem sabe, desse encontro de saberes nesse momento de transição, não estejamos forjando o Homo sustentabilis?”
A pergunta levantada por Marina Silva retoma a questão da transitoriedade da espécie. Se o ser humano é um ser em transição sujeito a uma mutação cultural, de comportamento, como propõe Sri Aurobindo, ele transita em direção a que? Qual será a modalidade de ser que o sucederá?
A atual transformação da consciência é induzida pela necessidade de dar respostas a crises climáticas e ambientais, pela razão e pelo conhecimento científico que proporciona crescente compreensão sobre o funcionamento do cosmos e da vida.
A percepção de que somos um ser em transição se encontra presente na internet, onde há mais de 3000 menções ao homo ecologicus. Como podemos definir as principais características desse ser emergente e que ainda dá seus primeiros passos? As atitudes e ações do homo ecologicus derivam de sua consciência ecológica que, por sua vez, é alimentada pelos conhecimentos dos vários ramos das ciências ecológicas. Ele atua tanto individualmente, em seu cotidiano, como também atua no sentido de que o grupo e a comunidade à qual pertence se organizem ecologicamente. Reconhece a sua co-dependência com a natureza, tem propensão a estabelecer consciência planetária, cósmica, universal; desenvolve a habilidade de desenvolver um respeito fundamental pela Mãe Terra Ele reconhece a inteligência contida no mundo natural e imita os processos naturais em suas tecnologias e práticas.
O homo ecologicus se caracteriza pelo comportamento de respeito à natureza e à biodiversidade; protege o meio ambiente e o valoriza em suas ações cotidianas, atuando em projetos de sustentabilidade e tornando-se agente de mudança ecologizada.
(*) Autor de Ecologizar, de Tesouros da Índia e de Ecologizando a cidade e o planeta www.ecologizar.com.br
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