É muito comum ouvir em tempos de crise ou de prosperidade indicações dos analistas sobre o que deveria ser feito, seja para manter um quadro bom, seja para reverter um ruim. As medidas são sempre da mesma natureza: manter fluxos de demanda crescentes requer instituições sólidas e agora, no seio dessa crise bancária sem precedentes, há urgência em estabelecer marcos regulatórios que evitem as enormes oscilações causadas pelos mercados financeiros, como disse Ben Bernanke agora pouco. No caso dos países emergentes, antes dessa onda da gastança dos Estados Unidos sem se preocupar com nada, os analistas urgiam os governos para implementarem reformas: previdência, tributária, comércio externo, política, etc. Diziam enfaticamente que sem essas reformas os países do dito Terceiro Mundo não iriam para lugar algum, nem crescer o suficiente. Nos anos recentes de bonança ninguém prestava atenção à falta de reformas que, por exemplo, no caso brasileiro foi marcante. Até porque a última reforma feita aqui, em 2003, no auge do final da crise de 2002, sequer foi regulamentada e desde então quase 200.000 novos servidores públicos foram contratados no regime previdenciário antigo, como se essa reforma nunca tivesse existido. Aquela recomendação ao governo brasileiro não foi seguida, mas quem se importava com isso, se a arrecadação crescia dois dígitos todos os anos, surfando na onda da globalização enriquecida pelos gastos das famílias estadunidenses que, mais tarde, provaram-se falidas e incapazes de sustentar a farra de todos. No final de tudo isso, essas recomendações - privatização, reformas, marcos regulatórios, regras de comércio externo, liberalismo, etc. - parecem que mesmo se fossem implementadas não seriam suficientes para revogar a base precária na qual todo o sistema econômico se assenta: a necessidade de crescer sempre, em variações percentuais de fluxos, como o PIB, fazendo de conta que o planeta é inesgotável e a economia pudesse ser maior que o planeta. Essa necessidade insana justifica qualquer atitude nessa direção, mesmo aquelas que quase causaram o maior desastre global da história da humanidade - se é que isso ainda não está para acontecer. Em suma, a raiz do problema é muito mais profunda, tem a ver com os objetivos que foram escolhidos pelo sistema, as metas, os meios e as decisões que tomamos para continuar nessa mesma rota, sem se preocupar com limites sociais e ambientais inescapáveis. Rota da qual incrivelmente e apesar de tudo ainda não temos a coragem e a capacidade de abandonar, pelo menos enquanto não atingirmos o limite da biosfera planetária atender todas as nossas demandas desnecessárias e irracionais, num sistema de desigualdade social e concentração de riqueza extremas, fato que não causa, pelo menos para a maioria, embaraço algum.
Hugo Penteado
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