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Perguntas e respostas para Gláucia Nascimento:
Perguntas:
Gláucia Nascimento: Vc é vegetariano? É contra o consumo de carne?
Hugo Penteado: Sou vegetariano. Ser contra é muito forte. Acho que as pessoas preocupadas com o planeta devem saber que suas decisões alimentares afetam os ecossistemas, por n motivos e que não dá mais para viver na atitude inconsequente da sociedade atual. A primeira consequência é nossa saúde: nós somos animais onívoros (nossa saliva é alcalina, a do carnívoro é ácida e a carne já derrete na boca; nosso estômago produz dez vezes menos ácido clorídrigo que o de um carnívoro; e finalmente nosso intestino é muito mais longo) e nossa capacidade de digerir carne é baixa e toda carne que comemos em excesso, principalmente em churrascos e em churrascarias, só serve para apodrecer dentro dos nossos intestinos e causar doenças, porque esse processo de apodrecimento injeta uma quantidade enorme de toxinas. Nós ficamos doentes em grande parte por causa dos nossos hábitos e a cura preventiva só se dará através de mudanças de hábitos e conhecer melhor assuntos de alimentação. Se queremos salvar os ecossistemas, temos que preservar o primeiro ecossistema que está intimamente ligado a nós, que é o nosso corpo. Outra questão sobre o consumo de carne é que não comemos a vida do boi, mas a sua morte, ou seja, toda energia gasta para fazer o boi viver e crescer fica para ele e é altamente ineficiente. Se todos nós virássemos vegetarianos, a oferta de alimentos aumentaria 10 vezes. Se os chineses continuarem aumentando o consumo de carne na sua dieta, estamos fritos, porque vamos gastar 10 toneladas de alimentos para os bois e delas tirar apenas uma tonelada. Essa é a equação: imagina o quanto de água, solo, ecossistemas e clima serão gastos para esse luxo. O pior é que a carne apodrece e um homem adulto que tenha comido muita carne, se passarmos um garfo em todo o seu intestino, iremos juntar 4 ou 5 quilos de carne das suas paredes intestinais que ficaram presos lá. Ou seja, comer carne em excesso é destruir ecossistemas, mandar animais para uma enorme crueldade e matança, apenas para produzir bolo fecal apodrecendo e doenças. É uma decisão muito estúpida e inconsequente que precisamos evitar.
GN: Recentemente estava, fazendo outro capítulo do meu tcc, onde fazia uma análise da PNEA.
Alguns pontos me pareceram vagos, e estou atrás de algumas interpretações. Por exemplo. No artigo 8º, inciso IV, parágrafo 2º
“I - a incorporação da dimensão ambiental na formação, especialização e atualização dos educadores de todos os níveis e modalidades de ensino”
Estou a me perguntar o que seria essa “dimensão ambiental”, que abrangência esse termo tem, quando mencionado na lei?
HP: A resposta é muito simples e nem sei se é isso que a lei prevê: todos os seres vivos da Terra dependem de todos os seres vivos. Defender o meio ambiente sem falar o motivo é pouco. Sem a Amazônia e o Cerrado todos estaremos mortos. Recentemente a ministra Dilma Roussef, candidata à presidência da República, disse ao ministro do meio ambiente que o Cerrado tinha que ficar fora das metas de redução dos gases do efeito estufa, causados pelo desmatamento, porque era área de expansão agrícola. Essa visão estanque não funciona mais: sem o Cerrado o aquífero Guarani morre e sem a água, a agricultura morre. Temos que entender que estamos todos vinculados com todos os seres vivos e com todos os ecossistemas, é uma rede e há limites para nossas extravagâncias. Não podemos mais assumir que somos a espécie animal dominante da Terra. Se olharmos para o meio ambiente como algo que precisamos presevar, não entendemos ainda que quem precisa ser preservado somos nós e a vida. Nós comemos, respiramos e vivemos graças a todos os ecossistemas e os seres vivos. A dimensão ambiental só fará sentido com esse entendimento sistêmico e quando a gente resolver nossa crise de identidade se somos deuses ou se somos espécie animal a favor da última. Se somos animais, somos dependentes e vulneráveis de todas as vidas, se somos deuses, pouco importa, podemos falar da dimensão ambiental como algo nada relacionado conosco e que por uma benção da nossa divindade, resolvemos cuidar.
GN - Referente a outro termo, muito freqüente na área de Educação Ambiental, o de “ética ambiental”. Procurei alguns artigos e não achei nada muito claro, acabei utilizando alguns conceitos de ética dos principais filósofos, para poder discutir a crise ambiental. Você tem alguma fonte pra me ajudar a entender melhor essa ética ambiental?
HP - A melhor fonte é o espírito de cada um. O formato acadêmico é o que menos importa. Todos são igualmente importantes. A questão é nosso excesso de individualismo e a forma como a interdependência que está por trás desse despertar é tratadas como algo negativo. Esse excesso de individualismo, consumismo, hedonismo, curtiprazismo (ênfase no curto prazo) e o uso do pronome pessoal da primeira pessoa (eu, meu) mostram que temos uma longa jornada ética pela frente. De qualquer forma, qualquer discussão de mudanças passa necesariamente por uma mudança geral de valores. Nada irá acontecer enquanto os cientistas não forem ouvidos, enquanto os interesses econômicos forem considerados imediatos e mais importantes.
GN - Na entrevista que vc deu à Marília Gabriela, ao final dela.. vc aponta algumas possíveis soluções, que podem amenizar a relação problemática que persiste entre natureza e sistema econômico dentre eles duas, eu queria que vc me explicitasse melhor :
“Dejetos eletrônicos devem ser alojados em locais apropriados a fim de evitar a poluição;
Os bancos devem estimular investimentos em fundos que almejam um manejo sustentável dos recursos ambientais.”
No primeiro caso, referente ao destino de pilhas, você comenta que ainda não sabemos onde alocar essas pilhas, que guardemos em casa, mas não existe nenhuma política empresarial que vise recolher esse material, que não pode ser dispensado em qualquer lugar?
E referente aos bancos. Como funciona, pelo menos no caso do Banco Real, onde vc atua esse manejo sustentável?
HP - Na verdade, mudar a forma como geramos lixo e trabalhar o conceito de lixo zero seria uma grande mudança que numa escala de zero a 1000 estamos ainda no número 1. A Terra foi transformada em uma lixeira conosco dentro e vivos, o que é muito pior. Os materiais degenerativos (incapazes de serem biodegradados) são dispensados no ar, na água e no solo e são assustadores. A meta de cada um deve ser lixo zero, devíamos começar a pensar que é muito melhor espremer laranjas e comer vitaminas naturais do que comprar vasilhames com sucos engarrafados cheios de conservantes, vitaminas artificiais e açúcar que contribui para ficarmos viciados. Nossos hábitos precisam ser alterados, enfim. O desperdício, a redução do consumo, a decisão de não comprar coisas que precisam ser descartadas faz parte desse salto de consciência que irá mudar todo mundo empresarial, porque até agora essas empresas não arcam com os custos das externalidades que produzem e esse faz de conta do sistema econômico leva a conclusões surrealistas sobre as possibilidades dele. Quem tiver consciência pára de comprar enquanto o sistema não revogar o conflito existente entre o sistema econômico e o planeta do qual ele depende: a economia é linear (extrai, produz, descarta) e a natureza é circular; a economia é degenerativa (introduz venenos na natureza que ela não é capaz de limpar, como combustíveis fósseis, metais, inseticidas e agrotóxicos) e a natureza é regenerativoa; e, finalmente, a economia pretender ser um sistema infinito, mas a natureza (e seus recursos principais, como água e solo) é finita. Revogar esse conflito deve ser o papel de todas as iniciativas de bancos e empresas que pretendem caminhar para a sustentabilidade e isso significa abandonar a idéia de crescimento eterno tão em voga nos dias atuais e mudar o paradigma, fazendo uso de todas as soluções tecnológicas e de eficiência disponíveis, além de mostrar as consequências e mudar a consciência de todos, para ver se será possível salvar parte da humanidade (porque não dá mais para salvar todos, o planeta já está revidando os estragos que fizemos).
GN - Referente à métrica do PIB, na entrevista com a Gabi, vc em um momento, aponta que o mentor do mesmo, Simon Smith Kuznets quando lançou a métrica do PIB, para a economia, o fez salientando que este deveria ser encarado como uma medida paliativa, pois o Kuznets admitia que sua métrica era falha.
Procurei no Google, e quase não encontrei nada sobre o Kuznets. E no pouco que achei, não encontrei nenhum ponto em que ele afirme o que vc traz.
E eu quero colocar essa problemática no tcc, como faço?
Vc tem alguma fonte, algum texto, que possa me indicar?
HP - Kuznets criou essa métrica para economia de guerra. Temos quatro operações aritméticas e o PIB só soma. Esse tema é complexo, mas como Nicholas Georgescu-Roegen explicou bem, antes de mudar a métrica, é preciso mudar os valores, por isso não acredito em mudança da métrica sem antes as pessoas mudarem seus valores (a economia e a humanidade são susbsistemas dependentes do planeta e não o contrário como todos acreditam).
(encaminhei à aluna vários textos sobre esse assunto)