Tem sido influenciada por um pensamento dominante em parte da diplomacia e em áreas ligadas à segurança nacional, o de que aceitar pagamentos externos pela conservação da floresta (ou outros recursos e serviços naturais) implica renúncia à soberania no uso desses
recursos. Essa atitude certamente terá influenciado a proposta que o Brasil apresentou, em Bali, de um Fundo para Proteção e Conservação da Amazônia Brasileira. Embora tenha o mérito de reconhecer que é preciso cuidar desse problema - já que o Brasil é o quarto maior emissor do mundo, com mais de 1 bilhão de toneladas de dióxido de carbono (inventário de 1994), das quais cerca de 75% em decorrência de desmatamento e queimadas -, a proposta não está vinculada a nenhum compromisso ou meta no âmbito da convenção do clima. É um fundo ?voluntário?, para o qual poderão contribuir países, instituições ou empresas, mas sem direito de contabilizar em seus balanços de emissões eventuais reduções obtidas por esse caminho - terão direito apenas a um ?diploma?.
O mecanismo do fundo toma como base uma média anual do desmatamento na Amazônia (outros biomas só depois de 2011, ?quando houver sistemas de monitoramento?) durante a década 1996-2005, que é de 19,5 mil km2. Nesse caso, se o desmatamento que vier a ser apurado em 2007-2008 for, por exemplo, de 14 mil km2, a redução terá sido de 5,5 mil km2, ou 550 mil hectares, comparada com aquela média; como cada hectare desmatado/queimado emite 100 toneladas de carbono e estas equivalem a 400 toneladas de dióxido de carbono, a redução de emissões será de 220 milhões de toneladas de CO2; e como cada tonelada será cotada a US$ 5, essa redução de emissões daria direito a receber cerca de US$ 1,1 bilhão.
O projeto brasileiro foi recebido com ceticismo quase unânime. O professor Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), acha que por esse caminho o Brasil conseguirá receber, no máximo, uns US$ 100 milhões por ano - que poderão ser do fundo criado pela Noruega (US$ 550 milhões por ano), do GEF ou do mecanismo da Nature Conservancy.
Além disso, é possível perguntar: que sentido faz um fundo para reduzir o desmatamento na Amazônia que toma por base 19,5 mil km2 anuais (a serem revistos só daqui a cinco anos), quando no período 2006-2007 o desmatamento efetivo já esteve em 11.224 km2? De julho
deste ano para cá, o desmatamento na região já aumentou 8% e se prevê que crescerá mais; mesmo que suba 20%, vai-se chegar a 14 mil km2/ano; comparados com a base de 19,5 mil km2, vai-se ter, no papel, uma redução de 5,5 mil km2 e credenciais para receber compensação por isso.
Da mesma forma, não parece muito adequado argumentar, como membros da delegação brasileira em Bali, que o Brasil ?fez sua parte? porque reduziu em três anos suas emissões em 1,3 bilhão de toneladas de CO2, com 38,1 mil km2 menos de desmatamento na Amazônia. Mais adequado seria lembrar que nesses mesmos três anos desmatamos 44 mil km2, que equivalem a 1,32 bilhão de toneladas emitidas. E, finalmente, preocupa a decisão de só considerar o desmatamento em outros biomas a partir de 2011. Só no Cerrado, diz relatório recente do Instituto Sociedade, População e Natureza que estão sendo desmatados 22 mil km2 por ano. >>
Parte final do artigo
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Washington Novaes
O ESTADO DE SÃO PAULO, 21 Dezembro 2007, p.2
O mecanismo do fundo toma como base uma média anual do desmatamento na Amazônia (outros biomas só depois de 2011, ?quando houver sistemas de monitoramento?) durante a década 1996-2005, que é de 19,5 mil km2. Nesse caso, se o desmatamento que vier a ser apurado em 2007-2008 for, por exemplo, de 14 mil km2, a redução terá sido de 5,5 mil km2, ou 550 mil hectares, comparada com aquela média; como cada hectare desmatado/queimado emite 100 toneladas de carbono e estas equivalem a 400 toneladas de dióxido de carbono, a redução de emissões será de 220 milhões de toneladas de CO2; e como cada tonelada será cotada a US$ 5, essa redução de emissões daria direito a receber cerca de US$ 1,1 bilhão.
O projeto brasileiro foi recebido com ceticismo quase unânime. O professor Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), acha que por esse caminho o Brasil conseguirá receber, no máximo, uns US$ 100 milhões por ano - que poderão ser do fundo criado pela Noruega (US$ 550 milhões por ano), do GEF ou do mecanismo da Nature Conservancy.
Além disso, é possível perguntar: que sentido faz um fundo para reduzir o desmatamento na Amazônia que toma por base 19,5 mil km2 anuais (a serem revistos só daqui a cinco anos), quando no período 2006-2007 o desmatamento efetivo já esteve em 11.224 km2? De julho
deste ano para cá, o desmatamento na região já aumentou 8% e se prevê que crescerá mais; mesmo que suba 20%, vai-se chegar a 14 mil km2/ano; comparados com a base de 19,5 mil km2, vai-se ter, no papel, uma redução de 5,5 mil km2 e credenciais para receber compensação por isso.
Da mesma forma, não parece muito adequado argumentar, como membros da delegação brasileira em Bali, que o Brasil ?fez sua parte? porque reduziu em três anos suas emissões em 1,3 bilhão de toneladas de CO2, com 38,1 mil km2 menos de desmatamento na Amazônia. Mais adequado seria lembrar que nesses mesmos três anos desmatamos 44 mil km2, que equivalem a 1,32 bilhão de toneladas emitidas. E, finalmente, preocupa a decisão de só considerar o desmatamento em outros biomas a partir de 2011. Só no Cerrado, diz relatório recente do Instituto Sociedade, População e Natureza que estão sendo desmatados 22 mil km2 por ano. >>
Parte final do artigo
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Washington Novaes
O ESTADO DE SÃO PAULO, 21 Dezembro 2007, p.2
Um comentário:
Quanta barbaridade! Será que alguem já fez a conta de quantos anos levaria para queimar a Amazonia inteira, de acordo com a atual velocidade de desmatamento? Quem tiver os dados e a coragem nas mãos talvez constate q não dure tanto quanto se pensa. A enorme maioria dos lideres parece não ter pressa de resolver nada, como se tivessemos a eternidade p/ encaminhar esta questão. O que mais falta acontecer p/ a sociedade acordar? Clarissa Rodrigues de Medeiros - clarissarmedeiros@gmail.com
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