quinta-feira, 14 de abril de 2011

As galinhas também amam

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Quando imobilizamos um bezerro, seu coração bate mais rápido, e a quantidade de adrenalina no seu sangue aumenta. Se a vaca, mãe do bezerro, observar a imobilização do filhote, seus batimentos cardíacos e a concentração de adrenalina também aumentarão, indicando que ela compartilha e está "preocupada" com o destino da cria. A descoberta da empatia entre mamíferos foi um dos argumentos usados para forçar os criadores de porcos e bovinos a adotar práticas "humanitárias" durante a criação e o abate desses animais.

A descoberta de que uma galinha é capaz de sofrer ao observar o sofrimento de outros membros de sua espécie é um bom argumento para quem defende melhores condições de criação e abate para os milhões de frangos que são produzidos, mortos e devorados pelo Homo sapiens a cada semana.

É incrível a necessidade de pesquisas para mostrar o óbvio...


Carlos Eduardo Lessa Brandão


http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110414/not_imp706007,0.php

São Paulo, 14 de abril de 2011

O Estado de São Paulo – VIDA – página A27

As galinhas também amam

Fernando Reinach – Biólogo

Poucas pessoas acreditam que um pé de alface sofre quando seu vizinho de horta é arrancado e devorado, ainda vivo, em uma salada. No outro extremo, ninguém duvida que uma mãe se preocupa e compartilha o sofrimento de seu filho. Apesar de a palavra amor fazer pouco sentido quando usada fora do contexto das relações entre seres humanos, a empatia - definida como a capacidade de um animal de ser afetado e compartilhar o sofrimento de outro membro da sua espécie - foi demonstrada em muitos mamíferos.

Para os estudiosos do comportamento animal, a empatia existe quando é possível demonstrar que um indivíduo, ao observar o sofrimento ou desconforto de um outro indivíduo, desenvolve reações semelhantes às de quem está sofrendo sem que as causas desse sofrimento estejam presentes. Ratos que observam seus filhotes sendo ameaçados por um predador desenvolvem reações semelhantes às apresentadas pelos filhotes ameaçados.

Quando imobilizamos um bezerro, seu coração bate mais rápido, e a quantidade de adrenalina no seu sangue aumenta. Se a vaca, mãe do bezerro, observar a imobilização do filhote, seus batimentos cardíacos e a concentração de adrenalina também aumentarão, indicando que ela compartilha e está "preocupada" com o destino da cria. A descoberta da empatia entre mamíferos foi um dos argumentos usados para forçar os criadores de porcos e bovinos a adotar práticas "humanitárias" durante a criação e o abate desses animais.

Nas aves, cujo cérebro é muito mais simples do que o dos mamíferos, a empatia nunca havia sido demonstrada. O cientistas acreditavam que o comportamento de uma galinha ao chamar os pintinhos no terreiro ou cobrir seus filhotes com as asas era totalmente automático e instintivo, não havendo a possibilidade dos sentimentos de um animal contagiar o outro por meio da observação visual. Agora isso mudou: foi demonstrado que uma galinha, ao observar o desconforto de seus pintinhos, sofre alterações metabólicas e comportamentais.

Trinta e duas galinhas foram estudadas nas semanas seguintes ao nascimento de suas ninhadas de pintinhos. O comportamento das galinhas foi analisado em quatro condições experimentais. Em todos os casos, os animais foram colocados em um pequeno cercado dividido ao meio por uma placa de vidro. De um lado ficava a galinha e do outro, os pintinhos. No primeiro experimento, os animais simplesmente ficavam separados. No segundo experimento, além de separados, uma pequena mangueira soprava "pufes" de ar a cada 30 segundos sobre as penas da galinha, o que causa um pequeno desconforto no animal (os pintinhos não eram incomodados). No terceiro caso, o ar era soprado em "pufes" sobre os pintinhos e a galinha não era incomodada. No quarto experimento, somente o barulho do ar era ouvido a cada 30 segundos, mas o ar não agitava as penas de nenhum deles.

Durante o tempo em que os animais ficavam em cada uma dessas situações, os cientistas mediram o batimento cardíaco das galinhas (usando monitores remotos), a temperatura da crista da galinha e de seus olhos (usando câmaras digitais sensíveis à temperatura) e o comportamento das galinhas (filmando todo o experimento e analisando as imagens).

O que foi observado é que, nas situações controle (sem ar assoprando ou somente com o barulho do ar), nenhum dos parâmetros medidos se alterou. Galinhas e pintinhos ficaram felizes, um observando o outro através da parede de vidro. Mas quando o ar soprava sobre a galinha, a temperatura dos olhos e das cristas da galinha mãe diminuía (uma indicação de estado de alerta). Ela parava de ciscar, tomando uma postura de cabeça levantada, também um sinal de alerta, mas seus batimentos cardíacos não se alteravam. O mais interessante foi o resultado obtido quando a galinha não estava sendo incomodada, mas simplesmente observava o ar soprando sobre os pintinhos. Nesse caso, a temperatura dos olhos e da crista também diminuíam, a postura de alerta ficava mais frequente e, além disso, os batimentos cardíacos ficavam mais rápidos e menos regulares. A galinha também emitia com mais frequência o piado típico de "venham para perto, pintinhos".

Os cientistas acreditam que isso demonstra que as galinhas mães, ao observarem visualmente o que estava acontecendo com os pintinhos, tiveram uma reação semelhante à que apresentavam quando eram incomodadas pelo mesmo tipo de estímulo. Isso demonstra que existe algum tido de empatia entre as galinhas e seus pintinhos.

Esta é a primeira vez que o "sentimento" de empatia e "preocupação" é formalmente demonstrado em aves. Tudo indica que as aves são capazes de uma forma primitiva de amor. A descoberta de que uma galinha é capaz de sofrer ao observar o sofrimento de outros membros de sua espécie é um bom argumento para quem defende melhores condições de criação e abate para os milhões de frangos que são produzidos, mortos e devorados pelo Homo sapiens a cada semana.

Mais informações em: Avian Maternal Response to Chick Distress. Proc. R. Soc B doi:10.1098/rspb.2010.2701 2011

Resumo:

http://rspb.royalsocietypublishing.org/content/early/2011/03/03/rspb.2010.2701.abstract?sid=88586d7e-b814-4fe9-99e0-72d422fb348e&cited-by=yes&legid=royprsb;rspb.2010.2701v1

Artigo na íntegra:

http://rspb.royalsocietypublishing.org/content/early/2011/03/03/rspb.2010.2701.full.pdf

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