quinta-feira, 30 de abril de 2009

Mais uma da série: "Querida, acho que destruí o mundo..."

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Lá vamos nós na crença que os ecossistemas e a biodiversidade estão aí para atender nossas demandas crescentes - e injustificáveis. Sem saber, a floresta produz água e a água produz a floresta e seus seres vivos. Quando ou se toda a vida sumir, a água some. A água só existe por causa dos seres vivos que habitam a Terra. Inclusive nós, nós fazemos parte do ciclo, claro. Sem os seres vivos, o planeta seca. A água é uma combinação de fatores da vida que aqui existe. Surrealista, eu estou admirado em pensar que a água de 60 ou 70% do meu corpo é um presente de vários seres vivos e eu não sei como agradecer, mas a única forma de agradecer é preservando-os. Assim como estou admirado em lembrar que meu coração bate porque um ser vivo armazenou a luz do sol para mim e eu nem consigo agradecer, exceto preservando-os. E estou admirado (ou assustado) com a nossa arrogância: mesmo tendo nos transformado em praga planetária à beira do colapso, ainda discutimos o sexo dos anjos e damos ouvidos a quem jamais merecia ser ouvido, como Bjorn Lomborg, que recentemente publicou mais um dos seus aplaudidos textos inúteis. Ainda andamos por aí sacudindo as benesses da modernidade, como sacolas plásticas e descartáveis, carros entupidores de almas e celulares emudecedores, deixando de lado o óbvio.

Código Florestal: Estudo de pesquisador da Embrapa sobre tamanho de área agrícola será debatido amanhã no Senado

Tese polêmica opõe ruralistas e ambientalistas

Daniela Chiaretti, de São Paulo
28/04/2009

O embate entre ambientalistas e ruralistas deve ter um novo e acalorado round amanhã, em Brasília. Uma audiência pública, organizada pela senadora Katia Abreu (DEM-TO), também presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), reunirá no plenário do Senado representantes das 11 comissões permanentes da Casa para debater a legislação ambiental. O pivô das discussões será um estudo polêmico, de um pesquisador da Embrapa, que pretende mostrar qual a disponibilidade de terras para ampliar a produção de alimentos e energia no Brasil - e a conclusão é "menos de 30%". No pano de fundo, os enfrentamentos na revisão do Código Florestal.
"Estamos há oito anos nos arrastando neste debate do Código Florestal e o que ocorre? Ficamos sempre uns contra os outros", diz Katia Abreu, que conseguiu que seu requerimento de audiência pública para discutir o tema fosse aprovado nas 11 comissões, expediente inédito no Senado e que indica a temperatura do assunto. "Como isso não tem um fim e ninguém está arbitrando, nós da CNA queremos que a ciência nos oriente de forma mais efetiva, do que é certo e errado", continua. "Quero ouvir os ecólogos, os cientistas, os que têm formação. Ouvir o que este pessoal tem a dizer para acabar com esta pendenga." Os ambientalistas também querem ouvir o que diz a ciência - o problema, no caso, é que não reconhecem este estudo como científico, sério, ou mesmo da Embrapa.

"É importante que os senadores tenham contato com diferentes visões e estudos", aplaude a senadora e ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva. "Mas as discussões hoje não se resumem a ter ou não estoque de áreas disponíveis, mas também tem a ver com o estoque de áreas degradadas semiabandonadas", registra. "Sei que os estudos que serão apresentados ainda não são conclusivos, são parciais. O importante é não tomá-los como uma receita. O próprio professor Evaristo admite isso", pondera.
Evaristo Eduardo de Miranda, chefe da Embrapa Monitoramento por Satélite, é o autor do controverso "O Alcance da Legislação Ambiental e Territorial", onde se conclui que tirando as unidades de conservação e as terras indígenas, sobram 29% do Brasil para ocupação agrícola - "apenas 29%", grifa. "Cerca de 71% do território está legalmente destinado a minorias e a proteção e preservação ambiental", continua o estudo, e "como mais de 50% do território já está ocupado, configura-se um enorme divórcio entre a legitimidade e a legalidade do uso das terras e muitos conflitos", conclui.

Os conflitos começam na própria Embrapa. Muitos pesquisadores da instituição discordam dos critérios, métodos e conclusão do trabalho. Dizem que os números foram divulgados e revistos três vezes e apontam incongruências. "Este estudo é da Embrapa", diz Geraldo Eugênio de França, presidente em exercício da instituição, para, logo na sequência, relativizar: "É um estudo importante, de um colega, mas não necessariamente a voz da instituição. É uma das vozes da instituição. A Embrapa é plural e temos muitos centros no Brasil estudando este tema sem termos, ainda, uma visão comum". Segundo ele, a Embrapa montou um grupo de trabalho com Miranda, Gustavo Ribas Curcio, da Embrapa Florestas (o outro pesquisador convidado por Katia Abreu a falar no Senado sobre seus estudos em Áreas de Proteção Permanente, as APPs) e outros quatro pesquisadores para, aí sim, "termos uma visão conjunta e institucional sobre o Código Florestal", diz França.

Miranda explica que seu estudo quis colocar no mapa o alcance territorial das leis promulgadas no Brasil envolvendo terras indígenas e ambiente. "Fizemos o trabalho a pedido da Presidência da República, que queria saber quanta terra disponível o Brasil tem para expandir a agricultura e energia, mas dentro da lei", conta. "Isso não quer dizer que em uma área protegida não se possa coletar açaí ou viver da pesca. Mas não é o que me perguntaram. Queriam saber quanto lugar o Brasil tem para plantar arroz, cana, milho, café, implantar pasto, produzir economia", continua. "A produção de laranja no Brasil não é no meio da mata. Você tem que remover a cobertura vegetal."
O trabalho seguiu quatro etapas usando mapas e imagens de satélite e modelos matemáticos. Em primeiro lugar, jogou-se no mapa todas as unidades de conservação federais e estaduais criadas no Brasil e as terras indígenas. Estas terras somariam 27% do território nacional. "Sobra 73% de Brasil", continua. Então calculou-se quanto deve ser destinado à reserva legal, um percentual previsto no Código Florestal que pode variar de 80% na Amazônia a 20% na Mata Atlântica. "No meu trabalho não me interessa se o cara cumpre ou não, estou apenas vendo o alcance territorial da legislação", continua. Chegou a 32% de território brasileiro que deve ir para a reserva legal. Depois, lançou as APPs, faixas ao lado de rios, em nascentes, topos de morros, encostas com declive, áreas que não deveriam ser ocupadas pela agricultura e chegou aos 29%. "Não estou dizendo se está certo ou não, meu trabalho foi só mapear isso aí", diz Miranda

Os ambientalistas apontam uma série de erros conceituais e de método. "O estudo tem problemas", diz André Lima, pesquisador do programa de mudanças climáticas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, IPAM, e que até 2008 era o diretor de políticas de combate ao desmatamento do Ministério do Meio Ambiente. "Ignora instrumentos de flexibilização previstos na lei, o que, no caso da Amazônia, dá diferenças de até 85%", continua. O equívoco, aponta Lima, faz com que o estudo salte de 291 mil quilômetros quadrados de área disponível na Amazônia, na primeira versão do trabalho, para 539 mil quilômetros quadrados, nas contas do Ipam. No Acre e em Rondônia, Estados que têm zoneamento econômico e ecológico, em áreas abertas ilegalmente, mas que hoje são consideradas aptas para agricultura, é possível recuperar 50% e não os 80% de antes. Este estoque de terras, somado ao de influência da BR-163 no Pará e parte do Mato Grosso, dá entre 65 mil e 85 mil quilômetros quadrados, que o estudo ignora.
Sergio Leitão, diretor de campanhas do Greenpeace, aponta outros erros. O estudo considera que, aplicada a lei, haveria 7% de áreas possíveis de serem usadas na Amazônia e que seriam, na verdade, 14%. O trabalho também não considera que pode haver exploração madeireira nas florestas nacionais e reservas extrativistas, por exemplo. "Qual é o grau de honestidade deste trabalho?", questiona Leitão. "Ele considera todas as unidades de conservação como restritivas. É como dizer: 'Os ambientalistas são maus, só querem deixar 7% da Amazônia para uso'", continua. "Este estudo veio dar o 'verniz científico para a tese que é preciso mudar a legislação ambiental. O problema é que o verniz é de péssima qualidade. Merece a lata de lixo."
Técnicos da Embrapa apontam que se trata de um estudo falso e de uma falsa questão. "Mas se estivesse certo, 30% do Brasil são 240 milhões de hectares, é coisa para caramba", diz um deles. "Daria quatro vezes a nossa safra, então, qual é o problema?", continua. "A questão real é aumentar a produtividade agrícola e recuperar as áreas degradadas."

terça-feira, 28 de abril de 2009

Descartáveis

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Em muitos lugares, empresas, faculdades, centros que estudam sustentabilidade, seus mentores, professores e participantes incrivelmente ainda usam copos descartáveis ou descartáveis de todos os tipos.

As mais novas novidades são plásticos para embalar guarda-chuvas na entrada dos prédios e papel higiênico nos mictórios. A dos guarda-chuvas, bem, essa estupidez começou com os prédios comerciais e agora está nos residenciais. Como que nossos avós faziam meu Deus na chuvarada???? A outra novidade é porta papel higiênico e papel higiênico no banheiro masculino ao lado dos mictórios. Nossa, como nunca sentimos falta disso durante centenas de anos??? A mera sacudidela do guarda-chuva e do genital parecia ser suficiente, mas, quanto desconforto sofríamos (até pensei, mas não vou descrever o segundo hábito, as pessoas ainda não perceberam o quão ridículo é...).

Segue decisão da UNB:

Restaurante da UnB veta o uso de copos descartáveis
(Fonte: G1)
Estudantes deverão usar bebedouro ou levar a própria caneca. Medida passa a valer a partir do mês de junho.
Os copos descartáveis serão proibidos no Restaurante Universitário (RU) da Universidade de Brasília (UnB) a partir de junho e quem quiser beber durante as refeições deverá usar os bebedouros ou levar a sua própria caneca. A medida foi definida pelo Núcleo da Agenda Ambiental (NAA) e aprovada pela Reitoria, segundo informações da UnB Agência.

Somente no almoço cerca de 4.000 pessoas comem no local. Como a média de consumo é de dois copos descartáveis por pessoa, são 8.000 unidades diariamente. Além de reduzir o custo para a universidade, a proposta é diminuir o impacto ecológico dentro da UnB.
Entre 14 e 16 de abril, foram distribuídas 2.000 canecas no restaurante para conscientizar a comunidade. Desde o ano passado, foram entregues 6.000 canecas.

A intenção é entregar outras mil em junho, durante o Seminário Ambiental que vai esclarecer dúvidas sobre a extinção dos copos descartáveis no RU e organizar a comunidade para a mudança de postura.
E assista ao vídeo do programa Cidades e Soluções – Sacolas plásticas, em:
http://www.mundosustentavel.com.br/globo220209.asp
visite a fonte de pesquisa: www.mundosustentavel.com.br



De um amigo:

Vamos a questão dos copos descartáveis. Acredito que ou faz, ou faz, não tem jeito. Aqui tenho uma piada para contar. Primeiro dia de aula do curso de especialização em Educação Ambiental. No intervalo, lanche acompanhado de refrigerante. E a surpresa, oh! Copinho descartável. Perguntei para a cooordenadora porque não foi pedido para trazer caneca ou outro. Não preciso nem dizer que houve silêncio e um sorriso amarelo. Insiti que deveria ser pedido para todos levarem sua caneca. O aviso não aconteceu. Na aula seguinte levei minha caneca novamente e o pessoal tem observado que existe um sujeito esquisito. Engraçado, estou procurando um lugar onde o que penso e pretendo fazer deixe de ser esquisito e olha o que acontece. E aí? Aumento a encrenca e arrumo confusão no curso, ou existe outra saída? Até agora estou procurando.

Escrevi:

Vale dizer que a mudança tem que ser interna, que não adianta nada falar de educação ambiental, quando ao mesmo tempo saem todos dali felizes e contentes transformando a nossa casa, o planeta, em uma enorme lata de lixo, com descartáveis. As pessoas ainda não sentiram, elas adotaram a filosofia NIMB: "not in my backyard" (não no meu quintal). Só aqueles que perceberam que somos todos interligados e que tudo está já se voltando contra todos, ação e reação, conseguem ficar horrorizados e evitar sacolas plásticas e descartáveis. É a falta de sensibilidade e consciência, junto com a enorme lavagem cerebral do nosso sistema (no mote "seja feliz sozinho"), que nos faz ainda ser tão irracionais como espécie animal.

De um outro amigo:

Sacos de plástico, copos, vasilhas, garrafas de plástico e todas estas porcarias que inventaram nos últimos 30 anos deveriam ser siplesmente proibidos e voltarmos aos dias das garrafas de vidro que iam e voltavam da Coca Cola e das engarrafadoras de cerveja e das empresas que distribuíam leite.

Escrevi:

Pois é, outro dia li um texto que falava o seguinte: a tal da modernidade está desgastada, vamos pouco a pouco descobrir que o que faziam milhares de anos atrás era o mais correto. Por exemplo, embalagens de plásticos jamais deveriam ser usadas, nem porque são um desastre para o lixo, mas porque é um tipo de embalagem que entra no conteúdo. O vidro não, ele não entra no conteúdo. Ou seja, quando usamos descartáveis de plásticos, transformamos eles numa fonte de alimento, porque eles se misturam ao conteúdo, tornando-o extremamente tóxico.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Primavera silenciosa em versão nacional

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Marcos Sá Correa é jornalista e fotógrafo. Formou-se em História e escreve na revista Piauí e no jornal O Estado de S. Paulo. Foi editor de Veja e de Época, diretor do JB, de O Dia e do site NO. É pai de Rafael Corrêa, colunista de O Eco.

Primavera silenciosa em versão nacional

23/04/2009, 14:32
O governo federal ficou devendo aos brasileiros na semana passada uma boa crise interna. Ela foi explicitamente provocada pelo relatório da Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos, divulgado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa. E passou em brancas nuvens.

O documento do Ministério da Saúde era, ao mesmo tempo, oficial e alarmante, como raras denúncias ambientais, vindas dos mais radicais militantes, conseguem ser. Em 1.773 amostras de 17 produtos agrícolas, escolhidas pelos pesquisadores ao longo de meses em estados diferentes, acusava altos índices de contaminação por inseticidas, em 64,3% dos pimentões, 30,29% das cenouras, 19,8% dos alfaces e 18,27% dos tomates.

Terrorismo agrícola

Pelo visto no dossiê, quase tudo o que atualmente sai do campo para a mesa sem o selo da agricultura alternativa tem boa chance de estar envenenado por inseticidas. Com pontaria acidental e ironia involuntária, a contaminação atinge de preferência as hortaliças que os nutricionistas recomendam como base da dieta saudável. O que banaliza velhos clichês da ficção conspiratória, aqueles que povoavam histórias em quadrinhos com terroristas capazes de envenenar cidades inteiras em atentados secretos contra os reservatórios de água potável.

Mas o Brasil moderno e democrático, isso se faz às claras. O país dá conta da tarefa com gente pacífica e obstinada, que moureja de sol a sol para intoxicar inadvertidamente o solo e os rios, depois de enegrecer o ar com a fumaça das queimadas. Além de ser um grande produtor mundial de CO2 no campo, o Brasil é uma potência econômica em agrotóxicos.

Gasta com inseticidas 7 bilhões de dólares por ano. Usa livremente ingredientes como o acefato e o metamidofós, proibidos até na Índia e na China, que também têm muitas bocas para prover e pouco tempo para perder com devaneios pastorais. Permanece imune aos efeitos do livro Primavera Silenciosa, da bióloga americana Rachel Carson, que há praticamente meio século deu empurrão decisivo para trazer a ecologia dos debates acadêmicos às páginas dos jornais e às cartilhas de educação fundamental.

Ministros imunes

Sua primeira edição data de 1962, quando o Brasil era governado pelo presidente João Goulart. É, portanto, para lá de histórica. De lá para cá, passaram por aqui três regimes políticos e inumeráveis desgovernos. O órgão federal encarregado de velar o meio ambiente mudou de nome e estrutura burocrática três vezes. Bafejada por incentivos fiscais e uma política de ocupação territorial que só preserva mesmo o modelo fundiário das sesmarias coloniais, a agricultura brasileira extinguiu as florestas do Oeste Paranaense, varou de ponta a ponta no Cerrado e cravou fundo na Amazônia os dentes das motosserras. Mas autoridades nacionais ainda não acordaram para o fato de que Carson não é mais, há décadas, uma autora minimamente controversa.

Foi ela que abriu os olhos de quase todo o mundo para os riscos dos inseticidas, essa nova espécie de praga agrícola, gerada em laboratórios e vendida por multinacionais. No Brasil, Carson não pegou. Nesses 47 anos, os ministros da Agricultura nunca aprendem que não estão no cargo como lobistas do agronegócio ou mesmo como porta-vozes da justiça social no campo. Nem que deveriam velar, antes de mais nada, pelo direito constitucional de todo brasileiro à saúde e à segurança alimentar.

Do outro lado da praça, os ministros do Meio Ambiente ase comportam como se luta fosse exclusivamente travada em trincheiras políticas cavadas no mato profundo. Como se o que acontece lá no mato jamais batesse à casa das pessoas comuns, por mais urbanas que elas sejam. Por exemplo, em forma de pimentão envenenado que gerações de agricultores viciados em inseticidas despacham candidamente do campo para a cidade.

Nossos ministros do Meio Ambiente são peritos na arte de reduzir sua pasta à irrelevância, perpetuando a miragem de que Meio Ambiente é, na vida real, tudo aquilo que não interessa a ninguém. E assim, por falta de Rachel Carson e de governo, o relatório do ministério na Saúde passou ao largo dos ministros da Agricultura e do Meio Ambiente, como se eles não tivessem nada a ver com a história. São os únicos brasileiros que os venenos agrícolas não atingem.

***

Parabéns pelo artigo. Estou lendo mais um dos livros do cientista James Lovelock, no qual ele relata que as florestas produzem água e água produz as florestas e que, para surpresa minha, se toda a vida desaparecesse desse planeta, a água também desapareceria. Mais um ponto de conexão oculta com a natureza da qual dependemos para estarmos vivos. No Conta Corrente, programa voltado para mercados financeiros, o Guto Abranches, excelente jornalista, sempre pede aos entrevistados um tema, uma palavra. Eu disse na última vez que lá estive: "Sem a Amazônia milhões de brasileiros irão morrer." Sem saber, eu ainda amenizei a fala, a pedido de um amigo meu brasileiro e também cientista, apenas à guisa de ser melhor ouvida. O correto seria: "Sem a Amazônia, poucos brasileiros irão sobreviver." Os economistas tradicionais trabalham com a idéias estapafúrdia que poderemos viver sem água, sem planeta, sem florestas, sem ecossistemas, sem biodiversidades. Eles realmente ignoram que o coração deles só bate porque há um ser vivo que armazena a luz do sol. Essas idéias estapafúrdias recheiam a cabeça do nosso governo em torno das prioridades, sem saber que não passam da receita do caos total, do qual não escaparemos. Enquanto isso, no outro lado do Olimpo, escuto as discussões sobre sustentabilidade que apenas dizem o seguinte impensadamente: "não abrimos mãos dos lucros, mas do planeta tudo bem". A ideologia econômica que abrange os quatro cantos do orbe é uma que prevê que a economia pode ser maior que o planeta. Ignora completamente as preocupações sistêmicas que nasceram 100 anos atrás com o avanço da física e mais de 50 anos atrás com as idéias de Nicholas Georgescu-Roegen (1906-1994). É assustador realmente perceber tudo isso no meio de intervenções no paciente que só o farão piorar.

Parabéns mais uma vez. A nutrição, economia e o meio ambiente são elos que sempre revelaram vários dos nossos erros e dessa vez não será diferente.

Abraço

Hugo Penteado

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Com a palavra a Senadora Marina Silva:

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O que me traz a esta tribuna são os ataques e retrocessos à legislação ambiental de nosso País. O meio ambiente é um tema estratégico para o nosso tempo, para este século. Como muitos já disseram, estamos vivendo a era dos limites, e não haverá saída se não formos capazes de resolver a crise ambiental global que estamos atravessando.

No Brasil, vemos atualmente uma situação estranha, que marcha na contramão da História e dos movimentos das demais nações do mundo. O movimento ambiental começou a ganhar força no mundo após a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em 1972, em Estocolmo, na Suécia. E, aqui no Brasil, após a Constituição de 1988, a partir da comprovação, cada vez mais cabal e alarmante, de que a forma como as atividades econômicas vinham sendo desenvolvidas estavam provocando danos graves e muitas vezes irreparáveis ao meio ambiente e à saúde das populações.

Neste segundo mandato do Presidente Lula, declarações de diversas autoridades públicas, bem como a manifestação de diversos representantes da área econômica nacional, estão buscando cunhar um novo diagnóstico: no lugar do meio ambiente, vítima das atividades econômicas malconduzidas, são as atividades econômicas que estariam sendo prejudicadas devido ao excesso de proteção do meio ambiente.

Essa inversão a gente vai percebendo no discurso, na narrativa, nas atitudes e nos encaminhamentos práticos que, mais adiante, vou mencionar. As evidências disso estão por toda parte. Podemos vê-las nas declarações públicas de algumas das mais altas lideranças
políticas empresariais deste País, de vários setores das atividades produtivas e também de autoridades públicas, como, por exemplo, o Ministro da Agricultura, dos Transportes, das Minas e Energia, da Pesca, de Assuntos Estratégicos. Todos parecem buscar formar na
sociedadea percepção de que foi um erro, ou talvez um deslize, terem sido criadas as leis e as instituições que têm a finalidade de proteger o meio ambiente. Alguns deles dizem abertamente que "a legislação ambiental do País foi criada para atender a interesses de estrangeiros ou a interesses escusos não confessos". Essa declaração foi do Ministro Mangabeira Unger; saiu em jornais do País e não foi desmentida.


Não faltam matérias na mídia em que representantes dos segmentos do agronegócio, da infraestrutura se revezam em um jogral de satanização das conquistas ambientais que a sociedade brasileira conseguiu inscrever no arcabouço legal de nosso País. Como exemplo, posso citar o caso de alguns segmentos do agronegócio. Agora estão imbuídos em "convencer" a sociedade brasileira de que a legislação que protege o que restou da floresta, que protege a nossa biodiversidade e as margens dos rios é a maior inimiga para o crescimento e expansão da agricultura no País.

Essa inversão é nefasta, porque é exatamente o contrário. A proteção das florestas, da biodiversidade é a maior responsável pela proteção e pelo crescimento sustentável da agricultura, tão necessária ao desenvolvimento de nosso País. Basta ver que, para se produzir um quilo de frango, fazendo um cálculo bem subestimado, precisa-se de dois mil litros de água. Para um quilo de grãos, precisa-se de cerca de uma tonelada de água. Portanto, a proteção das florestas como responsável pela garantia e preservação dos cursos d'água não pode ser confundido como algo nefasto à agricultura.

Aproveitam para dramatizar ainda mais, dizendo que isso vai aumentar os preços dos alimentos e provocar escassez e fome. Com esse argumento, mudou-se a legislação ambiental no Estado de Santa Catarina - inclusive uma legislação estadual mudando uma lei federal, o que é claramente inconstitucional.

Quero ainda ressaltar, Sr. Presidente, que essa desdita, essa difamação que vem sendo feita da legislação ambiental brasileira é sempre acompanhada, seguida, de um conjunto de medidas que vão na direção de mudanças na legislação, em prejuízo dos acúmulos já alcançado.

Segundo declarações recentes do próprio Presidente Lula, o Brasil tem 60 milhões de hectares de terras agrícolas degradadas que precisam ser recuperadas. Note bem, Sr. Presidente, 60 milhões de hectares de terras agrícolas, agricultável degradada que precisam ser recuperadas.
Como essas terras ficaram degradadas? Com certeza não foi em função da ação da legislação ambiental. Foi exatamente o contrário: ações permissivas de modelos de desenvolvimento predatório levaram essas áreas a se tornarem inteiramente improdutivas. E para se tornarem
novamente produtivas serão necessários altos investimentos.

Se os cuidados tivessem sido tomados à época, com certeza isso não teria acontecido. Na ocasião, talvez, não se tivesse o conhecimento técnico-científico, o conhecimento político e a sensibilidade social para o problema da degradação ambiental e, consequentemente, da degradação dos solos. Naquele época não tínhamos, ainda, atentado para esses aspectos. Agora, não há nenhuma justificativa para se continuar defendendo o mesmo modelo predatório em prejuízo de uma ação preventiva que nos leve a um novo paradigma de desenvolvimento para todos os setores da sociedade.

Com a agricultura não é diferente. A propósito, seria bom que a Comissão de Meio Ambiente - e vou sugerir isso ao meu amigo o Senador e Presidente Casagrande - promovesse a exibição e um debate sobre o excelente comentário feito pelo jornalista Marcos Sá Corrêa e João Moreira Salles, cujo título é O Vale. Esse documentário, Sr. Presidente, trata da devastação da Mata Atlântica no Vale do Paraíba. É comovente assistir ao documentário. Terminei de vê-lo chorando, pois termina com uma imagem dramática. Mostra tudo o que aconteceu no Vale do Paraíba. Depois vai para uma região do Pará, parece-me que é a região de Altamira, e termina focando uma grande área devastada como se dissesse que cem anos depois eles se mudaram para cá em uma economia de rapina que não respeita os processos de regeneração dos ecossistemas. Além dessas questões que estou mencionando aqui, Sr. Presidente, uma série de outros eventos vem acontecendo. Um deles é esse da desqualificação das pessoas que defendem o meio ambiente, da legislação ambiental brasileira.

Uma coisa é certa: quando alguém... O Presidente Lula uma vez repetiu uma frase, que tomo emprestada não só do autor, mas já terceirizando-a do próprio Presidente Lula: "Não se importa que alguém tire uma flor do seu jardim? Depois, entra na sua casa, toma sua mulher, seus filhos e faz coisas muitos piores". Já não estão mais no nosso jardim. Já entraram há muito tempo na nossa casa, arrombando as portas da legislação ambiental brasileira. Só no Congresso Nacional são cerca de 18 projetos de decretos legislativos que propõem anular medidas administrativas de proteção ao meio ambiente, de criação de terras indígenas e de unidades de conservação, tanto do Ministério do Meio Ambiente quanto do Ministério da Justiça. São 18 projetos, Sr. Presidente.

Quanto às medidas provisórias, temos uma grande quantidade delas que, especificamente, vêm em prejuízo da legislação brasileira, sem falar naquelas que, não sendo objeto da legislação ambiental brasileira na sua origem, são geneticamente modificadas aqui dentro e são colocadas como verdadeiros cavalos de troia, em prejuízo dos avanços da legislação ambiental e das conquistas que já tivemos ao longo dos tempos.

Mas, para não ficar criticando os projetos de decretos legislativos dos colegas, porque são Senadores e Deputados que têm o direito de apresentar as suas propostas de lei, os seus projetos - mesmo divergindo do mérito, sei que eles têm esse direito -, vamos discuti-los e, no debate democrático, no discurso fraterno e na discussão do mérito, aprová-los ou não. Eu espero que não sejam aprovados porque serão maiores ainda os prejuízos. Mas é melhor a gente se ater à própria Casa e, dentro de Casa, a mim não me agrada, em hipótese alguma, o que está acontecendo. Primeiro, foi a Medida Provisória nº 422, que mudou os processos de regularização de terras na Amazônia, ampliando o limite de 400 hectares para 1.500 hectares de terras públicas. Foi aprovada um dia desses.

Graças a Deus, com o meu voto contra e o da minha Bancada, exceto por um Senador da minha Bancada, do Estado de Roraima, mais outros Senadores, somando 28 Srs. Senadores contrários a essa medida provisória a que colocamos a alcunha de Medida Provisória a Grilagem.

Agora nós temos a MP 458, que também trata de regularização fundiária. A MP 458, a despeito de enfrentar o caso fundiário da Amazônia, com a finalidade de aumentar a governança ambiental e a justiça social na região, foi concebida a partir da lógica do crescimento do fato consumado e assim, certamente, irá aprofundar os dois problemas, que são a grilagem - as pessoas ocuparam indevidamente as terras na Amazônia e agora vem um processo de regularização que vai alcançar aqueles que, de boa fé, têm posse mansa e pacífica e que já estavam contemplados no plano de combate ao desmatamento, quando elaboramos o plano, com os eixos que propusemos. E dentro de um dos eixos, que era o de ordenamento territorial e fundiário, estava a questão da regularização fundiária.

Infelizmente foi abandonada a ideia, a estratégia do ordenamento territorial e fundiário e ficamos só com a regularização.

Essa regularização da forma como está proposta, ainda que com o cuidado dos Ministérios do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Agrário de colocar algumas ressalvas para que as pessoas estivessem de acordo com a legislação ambiental, respeitando reserva legal e áreas de preservação permanente e outros dispositivos, tem outros artigos, Sr. Presidente, que dizem que o processo é autodeclaratório e que dispensa a vistoria.

Ora, Sr. Presidente, se o processo é autodeclaratório e dispensa a vistoria, todas as cláusulas que estão postas, com todo respeito, acabarão sendo "para inglês ver", porque ninguém que agiu de má-fé, que invadiu terra de forma criminosa vai declarar que de fato não tem direito àquela terra, que de fato a sua posse não é mansa e pacífica e que tem um monte de "laranjas" que estão querendo se regularizar.

Essa medida provisória está tramitando. Ela poderia ser uma limonada, mas será um limão para a sociedade brasileira, um limão para a Amazônia e um limão para esta Casa, para o Congresso Nacional, que ficará na história por, em plena crise ambiental global, estar abrindo literalmente a porta para regularizar, titular, privatizar 64 milhões de hectares de terras na Amazônia, um total equivalente ao Estado de Minas Gerais e de Santa Catarina.

Quando veio para esta Casa o projeto de gestão de florestas públicas, que tratava de 13 milhões de hectares por cerca de 20 anos, em um processo altamente transparente e controlado que previa inclusive auditorias independentes de pesquisadores, de cientistas, em um processo de licitação em que as florestas continuarão florestas e continuarão públicas, em um processo em que a prioridade para criação de unidade de conservação, demarcação de terra indígena, assentamento de comunidades tradicionais - depois é que seriam feitas as concessões onerosas em licitação -, quando há todo um processo de responsabilização, diziam que era privatização da Amazônia. Agora, são 64 milhões de hectares, com dispensa de vistoria, em um processo autodeclaratório. E eu não ouço os que diziam que era privatização dizerem que agora, sim, é privatização, para que deixem de ser floresta se não tivermos cuidado e ainda se transformem em terras privadas.

Continuando, Sr. Presidente, uma outra medida provisória, a MP 450, está criando um precedente pelo qual, no meu entendimento, poderemos ter novas Balbinas sendo construídas neste País, depois de tantas décadas de um empreendimento de triste memória que nos ensinou muito, e ensinou pelo erro, nos ensinou pela dor. Podemos estar abrindo novos precedentes para novas Balbinas.

Vou ler rapidamente, Sr. Presidente, pois sei que já estou abusando do acolhimento de V. Exª, o que diz a Medida Provisória nº 450. Outro exemplo é o da MP nº 450, que foi aprovada na quinta-feira na Câmara e que traz um artigo que guarda um grande potencial de problemas e agressões ambientais - podemos estar diante de novos desastres da dimensão de Balbina.

A "bomba" está no art. 17 da referida MP. A atual legislação das usinas hidráulicas até 30MW, que são as PCHs, estabelece limites para o tamanho do lago, que deve obedecer a uma fórmula que define uma relação entre o tamanho da barragem, a capacidade instalada e a área do lago, limitado a 3km². Ou seja, o lago de uma PCH não pode ultrapassar 3km², Sr. Presidente. O art. 17 da referida MP, que é o cavalo de Tróia que sempre está chegando aqui, cria uma nova categoria de usinas hidráulicas, entre 30MW a 50MW, que terão rito sumário de autorização...

O SR. PRESIDENTE
(Mão Santa. PMDB - PI) - Senadora, acabou a lei; agora, a graça. A senhora quer quanto tempo da graça divina?

A SRª MARINA
SILVA (Bloco/PT - AC) - Olha, o tempo da lei tinha um limite, que era até o Novo Testamento. O tempo da graça é ilimitado; todavia, quando se tem a graça, a gente mesmo cria a lei. E eu estou indo para me autoconter. Muito obrigada.

Na referida MP, as autorizações "sem as características de pequenas centrais hidrelétricas", ou seja, sem limites para o tamanho do lago, isso implica que poderemos ter muitas Balbinas espalhadas por aí, porque não há mais limite para o tamanho do lago de 30MW a 50MW e não haverá processo de licenciamento. Será um rito sumário, Sr. Presidente. Não
haverá um processo crível, respeitável.

Por último, Sr.
Presidente, a Medida Provisória nº 425 foi encaminhada ao Congresso Nacional, para tratar do Fundo Soberano. Na discussão, na Câmara dos Deputados, o Deputado Guimarães, do Ceará, apresentou uma emenda que dispensa os processos de licenciamento para investimentos que, segundo entendimento dele, já estão consolidados. O que seriam esses investimentos consolidados? E qual seria o alcance para, enfim, recuperação de estrada, duplicação de estrada ou estradas que já têm uma picada, uma pequena vicinal? Acontece, Sr. Presidente, que, quando se tem um pequeno ramal, como chamamos lá no Acre, ou uma pequena vicinal, e isso é transformado em uma BR asfaltada, com toda uma infraestrutura logística, a história nos mostra que, pelo menos, 50km de um lado, 50km do outro são destruídos.

No meu entendimento, essa flexibilização de alcance não mensurado por aqueles que propuseram e por aqueles que aprovaram essa medida provisória - e me parece que uma boa parte nem tinha consciência do que estava aprovando, para fazer justiça com alguns que, agora, com toda certeza, podem ir a público e dizer que não conheciam o alcance e o prejuízo que poderiam estar causando ao País e, particularmente, à Amazônia - vai favorecer
um empreendimento que é de altíssima gravidade, de altíssima complexidade ambiental, que é a BR-319, no Estado do Amazonas.

É uma das obras do PAC. O problema é que para viabilizar as obras do PAC não precisa passar por cima da legislação ambiental brasileira. Nós licenciamos a BR-163 dentro de um processo amplo, complexo, envolvendo 22 Ministérios, Sr. Presidente. Mas fizemos um plano de desenvolvimento sustentável para a área de abrangência da BR, que eu espero seja implementado.

A licença foi dada sem questionamento de nenhum segmento da sociedade, com um consórcio socioambiental para acompanhar os investimentos. Infelizmente, as coisas não têm andado, porque aquilo que é feito de forma estruturante dá mais trabalho, é mais difícil, mas, com certeza, é melhor do que os atalhos. Para concluir, Sr. Presidente, quero chamar a atenção de cada um de nós aqui. Essa medida provisória foi aprovada na Câmara dos Deputados.

Com todoo respeito aos meus colegas parlamentares, ela virá agora para o Senado. E espero que este Senado, que, simbolicamente, é a Casa da reflexão; este Senado, que, simbolicamente, é a Casa dos homens e mulheres mais amadurecidos - eu já tenho 51 anos -; possa fazer jus à ideia de um espaço da política institucional que tenha a obrigação não só de pensar aqui e agora, mas de ter um pensamento estratégico, uma visão de desenvolvimento sustentável, que seja capaz de fazer jus à potência ambiental que é o Brasil.
Que possamos preparar este País para o século XXI, na energia, no transporte, na agricultura, na educação, na saúde, nas mudanças climáticas que precisamos enfrentar em todos os seus aspectos. Que possamos fazer ver um fato ao Presidente Lula, que eu não sei se foi do conhecimento dele.

Hoje um Deputado, na Comissão de Meio Ambiente, disse que teve o encaminhamento da Casa Civil, mas eu espero que esta Casa possa reparar esse erro lamentável de abrir as porteiras para a devastação da Amazônia na situação que nós estamos vivendo de metas de redução de desmatamento, de metas em relação à redução de emissão de CO2, com catástrofes ambientais em todo o Planeta. E o Brasil, que tem um grande diferencial de ser um país que pode fazer a diferença, mesmo sendo um país em desenvolvimento, está perdendo sua vantagem diferencial.

Que possamos nos debruçar sobre essa matéria e, com todo respeito pelos Srs. Deputados, reparar o que aconteceu. Trata-se da MP 405-42. Nós devemos reparar o que foi aprovado na Câmara dos Deputados. Se por ventura (espero em Deus que não aconteça) for aprovado aqui também, espero que o Presidente Lula, em respeito ao esforço que ele fez nestes últimos quase oito anos de mandato (com plano de mudança climática, com plano de combate ao desmatamento, tendo reduzido a emissão de CO-2 em mais de um bilhão de toneladas, criado quase 30 milhões de hectares de unidade de conservação, tendo feito um esforço para haver medidas estruturantes de combate ao desmatamento), ponha um freio de arrumação nisso.

Cada um acha que pode dar palpite nas questões ambientais como se não tivéssemos uma política com estrutura, com vértebra! Que o Presidente vete o artigo que abriu a porteira para se fazer investimento desta envergadura sem licença prévia para isso. Mas espero que isso não seja preciso porque não é verdade todo esse discurso de desqualificação da legislação ambiental brasileira, em que as pessoas primeiro vão dizendo que a legislação foi feita com interesses escusos, que ela atrapalha o desenvolvimento, que os ambientalistas não se preocupam em ter energia, em ter estrada. Não é verdade!

Durante muito tempo, Senador Marco Maciel, os ambientalistas perguntavam aos desenvolvimentistas: "O que vocês podem fazer pelo meio ambiente?" Agora somos nós, os ambientalistas, que estamos dispostos a contribuir para ajudar o desenvolvimento.

Já foram chamados os ambientalistas para ajudar o Governador Blairo Maggi. Hoje, vi numa revista ele e oMinistro Minc dizendo que estão numa relação muito próxima. Eu até disse que só foi possível essa proximidade porque, no momento em que o Governador propôs revogar as medidas do Plano de Combate ao Desmatamento, as medidas foram sustentadas pela sociedade brasileira, mesmo com a minha saída do Ministério e com a chegada do novo Ministro, que deu continuidade às medidas. Agora é possível uma sinalização de que vão "fumar o cachimbo da paz". Mas, se as medidas tivessem sido revogadas como ele queria, com certeza, o desmatamento estaria aumentando. Espero podermos fazer aqui um amplo debate, com uma visão estratégica do que é o desenvolvimento em pleno século XXI, em plena crise ambiental global num País que tem a magnitude e a dimensão do Brasil, a responsabilidade, a audiência que tem o Brasil por ser um País menos adverso, por ser a maior potência hídrica do planeta.

Concedo o aparte a V.Exª, Senador Garibaldi Alves Filho.
O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senadora Marina Silva, quero congratular-me com V. Exª não apenas pelo conteúdo das suas palavras, mas até mesmo pela vibração, pelo entusiasmo com que V. Exª aborda os problemas da Amazônia, sobretudo problemas ligados ao meio ambiente. Quero dizer da minha admiração pelo trabalho de V. Exª não apenas como Parlamentar, mas também como Ministra que lançou as bases para uma efetiva política de proteção ambiental que se concretiza hoje graças ao trabalho de V. Exª e, agora, com o atual Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, que está continuando esse trabalho. Portanto, é sobretudo esta palavra de admiração que eu quero trazer e incorporar ao discurso de V. Exª.

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT - AC) - Muito obrigada, Senador Garibaldi, nosso presidente do Congresso até ainda há pouco. Agradeço as palavras afetuosas de V. Exª e concluo, Sr. Presidente, dizendo que o Congresso - façamos justiça - tem, aqui no Senado, uma comissão de meio ambiente, uma comissão de mudanças climáticas. Estamos criando estruturas novas dentro da Casa para debater o tema e que, aos poucos, ele possa ser internalizado não apenas no nosso discurso, no espaço institucional, mas nas nossas decisões.

sábado, 18 de abril de 2009

China

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Graças aos economistas que acreditam piamente na falta de transversalidade entre a dimensão econômica, social e ambiental e pregam aos quatro ventos crescimento econômico como única salvação social e renovação ambiental, somos obrigados a ler textos como o que transcrevo abaixo.

Para o leitor mais atento vale duas observações:

- consumo per capita de recursos naturais não pode ser medida de transição para um ambiente mais limpo, são os números absolutos que importam, a menos que se acredite que o espaço físico planetário seja inesgotável.

- a falsa dicotomia entre economia, empregos e planeta tem o seguinte recado implícito: não abro mão dos lucros corporativos, mas abro mão do planeta.

Estamos só lidando com mitos e deuses e um bando de pavões ou elite iluminada cantando alegres canções sobre a mudança da humanidade...

Carta da China - Ano 6 - 17 de abril de 2009
Edição Nº 46 | 5
www.cebc.org.br

Meio ambiente perde relevância – Programas de incentivo a despoluição e redução de emissão de gases nocivos, lançados pelo governo com o intuito de amenizar críticas internacionais quanto à degradação ambiental na China durante os Jogos Olímpicos de 2008, demonstraram resultados. Embora o país ainda tenha longo caminho a percorrer para tornar-se exemplo, a China conseguiu reduzir em 2008 significativos 5,95% a emissão anual de dióxido sulfúrico e em 4,42% a demanda por oxigênio químico, valores respectivamente inferiores 1,29 p.p. e 1,28 p.p. ao registrado em 2007. O consumo de energia per capita, por sua vez, também apresentou redução, de 1,32 p.p. se comparado a 2007 e 3,36 p.p. com base em 2006, encerrando 2008 com queda de 4,59%. Com o aparente sucesso de campanhas para uso consciente de recursos energéticos no período pré-olímpico, governo central pretende lançar nova campanha nacional de incentivo à economia de energia em 2009.

Durante as reuniões do 11º Congresso, o tema meio ambiente não obteve o mesmo destaque dos dois últimos anos. Ao contrário do que vinha sendo observado, não foi mencionada qualquer intenção de aumentar esforços governamentais para punir indústrias excessivamente poluentes, restringindo-se somente a promessa de maior fiscalização das mesmas. Com a desaceleração econômica do país, proteção ambiental parece voltar a ser ônus o qual Pequim não pretende necessariamente somar ao setor empresarial chinês, tampouco ao orçamento governamental, visto que desde o lançamento do pacote de estímulo em novembro de 2008 o montante destinado ao meio ambiente já foi reduzido.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Meio ambiente, saúde e desenvolvimento sustentável

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Meio ambiente, saúde e desenvolvimento sustentável.

Por Henrique Rattner, professor da FEA-USP e consultor do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). Foi fundador da Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Lideranças (ABDL) e diretor do programa LEAD no Brasil.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

O Brasil é grande, mas o mundo é pequeno

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O Brasil é grande, mas o mundo é pequeno

Eduardo Viveiros de Castro

Ao contrário do que disse o Ministro Extraordinário de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, a Amazônia não é uma “coleção de árvores”. Estas existem nos hortos botânicos e nos jardins de palácios. A Amazônia é um ecossistema, uma floresta composta de árvores e uma infinidade de outras espécies vivas — inclusive seres humanos, que lá estão há pelo menos quinze mil anos.

A Amazônia jamais foi um vazio humano antes da invasão européia; ao contrário, seu nadir demográfico foi alcançado após a invasão, com suas epidemias, seus massacres metódicos, seus descimentos forçados das populações nativas para fixação em missões e feitorias. E as populações indígenas encontraram, ao longo destes milênios de co-adaptação com o ecossistema amazônico (ou ecossistemas - pois a Amazônia não é uma só, mas muitas), soluções de “sustentabilidade” infinitamente superiores aos processos truculentos e míopes de desmatamento com correntes, desfolhantes, motosserras e assim por diante. A floresta amazônica sempre foi povoada, e nunca foi, ou não é há muitos séculos, milênios talvez, “virgem” — a maioria das espécies úteis da floresta proliferou diferencialmente em função das técnicas indígenas de aproveitamento do território e de seus recursos. Mas do fato da floresta não ser mais virgem não se segue que seja legítimo estuprá-la. Pois é exatamente isso que se está fazendo.

A Amazônia está sim sofrendo um violento processo de agressão — e digo a Amazônia, não a tal coleção de árvores — a Amazônia inteira, suas populações tradicionais e suas miríades de espécies vivas. Um novo modelo de desenvolvimento, como tem sido reiteradamente pregado para o Brasil, , um que não seja a imitação simplória das receitas norte-européias, precisa ser um modelo que ponha a floresta no centro da equação — pois chegou-se a um momento da história do planeta onde a vida é o valor em crise — a vida humana e não-humana. Não é mais possível fazer política sem levar em consideração o quadro último em que toda política real é feita, o quadro da imanência terrestre.

Usei a palavra imanência deliberadamente aqui. O ministro Mangabeira Unger falou em entrevista recente que o destino do homem é ser “grande, divino; não é ser uma criança aprisionada em um paraíso verde”; e que “todas as pessoas são espíritos que desejam transcender”. Os índios concordariam com o senhor de que todas as pessoas são espíritos; talvez não concordassem com a idéia de que só os seres humanos são pessoas, mas este é um outro problema. Com certeza, porém, não concordariam com a idéia de que todos os espíritos ou pessoas “desejam transcender”. Esta é uma afirmação que soaria aos ouvidos indígenas inquietantemente parecida com aquela que eles vieram ouvindo com tanta insistência durante os cinco séculos desde a chegada dos europeus — a afirmação de que eles são crianças que precisam ouvir a mensagem divina da transcendência para se tornarem seres humanos plenos, a saber, cristãos e bons cidadãos (i.e. com muita fé e nenhuma terra). Estou falando, naturalmente, da conversão e da catequese forçadas, às quais se juntaram, naturalmente também, a sujeição econômica e política dos povos indígenas e uma história de etnocídio.

Os índios não estão “aprisionados em um paraíso verde” como disse o ministro. A Amazônia não é um paraíso; ao contrário, é uma laboriosa construção co-adaptativa, um sistema em equilíbrio dinâmico onde entraram a engenhosidade técnica humana (indígena) e as infinitas engenhosidades naturais das espécies que ocupam a região. E os índios não estão aprisionados lá.

A idéia de que as populações indígenas precisam ser “liberadas”, que Mangabeira Unger expôs em certo texto recente, parece-me visceralmente equivocada. Os índios que sofrem de depressão, suicídio, alcoolismo, são justamente os índios que não dispõem de terras. Os índios do MS, por exemplo. Não os índios da Amazônia como os Yanomami, povo forte e feliz, justamente por gozar de um território à medida de suas necessidades vitais e espirituais.

As áreas indígenas da Amazônia são as áreas menos desmatadas, são elas que detêm a devastação nas fronteiras do país; e elas são peça essencial no processo de regularização ou estabilização jurídica da situação fundiária caótica que é a Amazônia, o paraíso da grilagem, da pistolagem, do narcotráfico, do contrabando e do subsídio. A Amazônia tem hoje cerca de 20% de seu território desmatado — nas áreas indígenas, é menos de 1%. Em Rondônia, a situação é catastrófica. Em Roraima, o que temos são arrivistas (arrozeiros) vindos do Sul surfando na onda da ditadura (integrar para não entregar), que sustentam um sistema político local baseado na corrupção generalizada e na exploração extensiva de áreas sem nenhuma incorporação significativa de mão de obra. E ainda querem culpar os índios.

O General Heleno levantou uma lebre inexistente, e se fez porta-voz dos interesses mais retrógrados, civilizacionalmente, que hoje cobiçam a Amazônia. E o problema da Amazônia, ou do desenvolvimento da Amazônia, não é a falta de idéias, mas o excesso de interesses — o conflito de interesses, nem todos interessantes para o país. A posição do governador de Mato Grosso, que conjuga de maneira eticamente miraculosa (meu primeiro eufemismo do dia) o papel de representante de um Estado da federação, seu maior agente econômico e seu principal devastador ecológico, é repugnante, sob todos os títulos.

Naturalmente, os índios sofrem de vários problemas, muitos deles causados pela incúria dos órgãos e agências de estado que deveriam fazer respeitar seus direitos constitucionais. Mas também não se pode negar que os índios conhecem outras dificuldades de adaptação às formas socioeconômicas (e espirituais) da sociedade nacional. Não porque lhes faltem oportunidades (ainda que lhes faltem, em muitos casos), mas porque suas culturas e sociedades escolheram desde muito cedo na história um caminho civilizacional radicalmente distinto do nosso — o que chamei de via da imanência em lugar de via da transcendência. As culturas indígenas não estão fundadas no princípio de que a essência do ser humano é o desejo e a necessidade. Seu modo de vida, seu “sistema” de vida, no sentido mais radical possível, é outro. Os índios não rezam pelo sistema econômico-teológico ocidental que consiste em tirar das pessoas o que elas têm e fazê-las desejar o que não têm – sempre. Outro nome desse princípio é ”capitalismo”, ou “desenvolvimento econômico”. Esta é a teologia bíblica da falta e da queda, da insaciabilidade infinita do desejo humano perante os meios materiais finitos de satisfazê-los.

O desenvolvimento é sempre suposto ser uma necessidade antropológica, exatamente porque ele supõe uma antropologia da necessidade: a infinitude subjetiva do homem – seus desejos insaciáveis – em insolúvel contradição com a finitude objetiva do ambiente – a escassez dos recursos. Estamos no coração da economia teológica do Ocidente, como tão bem mostrou Marshal Sahlins; na verdade, na origem de nossa teologia econômica do “desenvolvimento”. Mas essa concepção econômico-teológica da necessidade é, em todos os sentidos, desnecessária. O que precisamos é de um conceito de suficiência, não de necessidade. Contra a teologia da necessidade, uma pragmática da suficiência. Contra a aceleração do crescimento, a aceleração das transferências de riqueza, ou circulação livre das diferenças; contra a teoria economicista do desenvolvimento necessário, a cosmo-pragmática da ação suficiente.

Os índios são os senhores da imanência. Que transcendência temos nós, os orgulhosos brasileiros - supostos representantes da Razão e da Modernidade - a oferecer a eles, neste desanimador começo de século? É mais fácil os índios nos libertarem que nós irmos libertar a eles. Pelo menos em espírito.

Palestras de sustentabilidade

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Desde há muito quero escrever sobre as palestras que dei. Fiz mais de 200. Não cobro ou nunca cobrei por elas, mas aceitei pró-labore de quem me ofereceu, como a prefeitura do Rio de Janeiro, um agência de palestras e o Espaço Cultural CPFL, onde só há pessoas fantásticas realmente conscientes. Uma empresa: CPFL. As empresas são feitas de pessoas, isso dá uma certa esperança, pois tudo pode mudar. Agora que todos lerem aqui, nem o pró-labore receberei, mas o dinheiro é muito bem empregado, isso posso afiançar, se eu acertasse na Sena eu já até me veria num quadro da Ana Maria Braga criticando o fato dela ter um iate gigante, uma casa gigante e uma fazenda gigante ao dizer: "vou usar o dinheiro para projetos sociais que farei parte, isso vai me trazer muito mais felicidade, do que comprar coisas para mim que, quando eu morrer, não levarei comigo. Conosco levamos só o bem que fizemos, uns aos outros e a a natureza e a todos os seres vivos." Não jogo na Sena mais. Já joguei.

Acordei e fiquei mais uma vez pesaroso, recebi um email de uma instituição pedindo para assinar uma petição para parar as crueldades feitas pelo exército dos EUA contra bichos indefesos, cuja tortura (não vou descrever tudo, comecei a ter uma taquicardia) é usada para endurecer os soldados. Bom, desculpem a quem deixei triste com isso. Mas agora tenho mais pena dos que impingem essa dor do que aqueles que sofreram. Os que sofreram nós os encontraremos em algum lugar no universo. Os que provocaram a dor, desaparecerão para sempre, a pior morte que existe não é a do corpo, mas a do espírito.

Voltando às palestras, vou hoje fazer mais uma e eu tenho alguns pontos para colocar.

O que é sustentabilidade?

Voltarei já já com a discussão dessa idéia tão disseminada, tão pouco compreendida. E simples, embora nós tenhamos a mania incrível de criar complexidades inexistentes, como os sofistas (filósofos da Antiga Grécia que vendiam o saber).

Ah, todos os economistas são sofistas. Além deles não conseguirem prever o futuro como dizem, são incapazes de uma abordagem sistêmica, mesmo no seu campo de atuação e ainda mais naquele campo que ignoram terrivelmente.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

O paradoxo da Amazônia

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O paradoxo da Amazônia

BRUCE BABBITT e THOMAS LOVEJOY

De um lado, o Brasil avança na diminuição da derrubada da floresta; de outro, a IIRSA ameaça impossibilitar o alcance de metas nacionais

A DESTRUIÇÃO das florestas ameaça a sobrevivência de todo o planeta. Em todo o mundo, a derrubada e a queima de florestas causam 20% do aquecimento global, mais do que as emissões de gases de todos os automóveis e caminhões. A maioria dos países vem falando muito e fazendo pouco para enfrentar o aquecimento global. O Brasil, porém, é diferente. O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, anunciou que o Brasil vai reduzir o desmatamento da Amazônia em 70% até 2017.
Ao fixar essa meta, o país lidera o mundo no esforço internacional para combater o desmatamento e tem o direito de exigir que as nações desenvolvidas cheguem a um acordo para compensar os países em desenvolvimento por "serviços ao ecossistema" fornecidos por florestas saudáveis.

No entanto, ao mesmo tempo em que o Brasil avança, outro programa, a IIRSA (Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional na América do Sul), ameaça acelerar a derrubada da floresta, impossibilitando o Brasil de alcançar essa meta nacional. A IIRSA é uma organização pouco conhecida, um tanto quanto misteriosa, financiada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento e por outras instituições multilaterais. Sua meta é construir uma enorme rede de novas rodovias internacionais atravessando a bacia amazônica. E essas estradas vão abrir a porta para invasões de terra, conflitos fundiários e desmatamento maciço.

No vizinho Peru, a IIRSA está trabalhando sobre dois corredores de transporte para o Brasil, incluindo uma estrada que atravessará os Andes, chegando a Cruzeiro do Sul e cruzando o coração do parque nacional Serra do Divisor

Agora que a rodovia Interoceânica ligando o Brasil ao Peru está quase pronta, não há necessidade dessas rodovias adicionais. No Equador, a IIRSA pretende penetrar na bacia amazônica por uma rota rodoviária e hidroviária passando pelo parque nacional Yasuni. E, na Colômbia, a IIRSA propôs mais uma rota em direção leste, até Manaus.
Tais planos superados de construção rodoviária deveriam ser descartados. A questão não é se se deve desenvolver a Amazônia com infraestrutura, mas sim como o desenvolvimento pode ser planejado em base sustentável, voltado ao futuro, ao mesmo tempo protegendo os valores naturais da Amazônia e seus moradores.

No mínimo, é fundamental que sejam discutidas as seguintes questões: 1) Onde o desenvolvimento deve ser localizado na Amazônia ocidental? Com planejamento, novos centros populacionais podem ser desenvolvidos nos lugares certos, do mesmo modo como Brasília foi planejada para ser a capital nacional, em local escolhido para isso. A zona econômica livre em Manaus é um modelo que poderia ser empregado em outro lugar para concentrar o desenvolvimento e evitar a derrubada da floresta.
2) Novas pesquisas científicas nos informam que a cobertura florestal da Amazônia é essencial para manter o regime de chuvas adequado em partes do Sul do Brasil e em suas agroindústrias. A Amazônia não pode ser desenvolvida com a destruição de sua floresta e o desencadeamento de secas no Amazonas, em Mato Grosso e mais ao sul. Como podem as florestas virgens da parte superior do Amazonas ser protegidas contra o desmatamento extenso que já ocorreu na fronteira da Amazônia oriental?
3) O Amazonas histórico é um rio baseado num sistema econômico e ecológico. Até que ponto as vias hídricas naturais do Amazonas e seus afluentes podem ser desenvolvidos para servir de corredores de transportes? Que papel poderiam desempenhar as ferrovias?
4) Petróleo e gás estão sendo descobertos em toda a Amazônia ocidental. Onde devem ser estabelecidos os corredores rodoviários e os oleodutos, para dar acesso a essas reservas e aos locais mais apropriados para o desenvolvimento hidrelétrico futuro?
Nenhuma dessas questões foi levada em conta pelos construtores de estradas da IIRSA. E essas perguntas não podem ser respondidas sem a participação significativa de todos os povos da bacia amazônica. Um plano verdadeiro precisa consistir em mais do que apenas a abertura de milhares de quilômetros de asfalto novo.
Os planos infraestruturais da IIRSA para a Amazônia precisam ser suspensos e revistos à luz de conhecimentos científicos atuais. Há tempo para um novo consenso para o futuro. Com bom planejamento, a Amazônia pode ter florestas saudáveis e, também, comunidades dinâmicas.

BRUCE BABBITT, 70, geólogo, é doutor em direito pela Harvard Law School. Foi governador do Arizona (1978-1987) e secretário do Interior dos EUA (1993-2001). É autor de "Cities in the Wilderness" (Island Press, 2002).
THOMAS LOVEJOY, 67, biólogo com doutorado pela Universidade Yale, foi vice-presidente do World Wildlife Fund (1973-1987, EUA), secretário-assistente da Smithsonian Institution (1987-1999) e assessor-chefe de biodiversidade do Banco Mundial (1999-2002).

terça-feira, 14 de abril de 2009

Gilles Lapouge: Coreia do Norte põe em risco sonho de Obama

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Gilles Lapouge: Coreia do Norte põe em risco sonho de Obama

Como Teerã, Pyongyang usa o poder atômico como trunfo político

Gilles Lapouge - O Estado de S. Paulo

PARIS - É preciso reconhecer que o momento foi perfeito, como num espetáculo de teatro bem dirigido. Em Praga, o grande ator, a estrela do mundo, Barack Obama pleiteava um universo sem armas nucleares e se oferecia para organizar uma cúpula sobre o tema. Acrescentou uma daquelas belas frases que exaltam os corações: "O destino humano é aquele que nós fazemos."

No mesmo momento, num outro canto do vasto teatro do planeta, um outro ator, secundário, um sujeitinho desprezível, lançava um foguete no céu luminoso do domingo. Esse foguete partiu da Coreia do Norte. O problema é que esse mesmo foguete poderia igualmente servir de vetor para um engenho nuclear.

Ao que parece, o tiro falhou. Nenhum novo satélite foi observado no cosmos, seja porque o teste foi um fiasco, seja porque se tratava não da colocação em órbita de um satélite, mas de uma maneira de dizer ao mundo e, em particular, aos EUA: "Estão vendo? Nós já tínhamos a bomba nuclear. Agora, temos um vetor para enviá-la até o Alasca." Nas duas hipóteses o aviso é o mesmo. Brutal. Bem à imagem dessa ditadura comunista em decomposição que é a Coreia do Norte e de seu estranho chefe, Kim Jong-il. Era sabido que Pyongyang preparava essa jogada de efeito.

Pensava-se que ele não ousaria ir até o fim. Ele ousou.

Durante essa bela semana diplomática, Obama havia mostrado que os EUA não têm apenas o rosto da estupidez ou da arrogância. Ele foi realista e pragmático, foi tolerante. E é por isso que o desafio do coreano é grave. Esse foguete com vocação nuclear que partia da Coreia enquanto Obama falava em Praga teve boa mira. Ele atingiu seu objetivo: o discurso de Obama.

Um discurso poderoso, como foi, outrora, o discurso de Martin Luther King: "Eu tenho um sonho." E se o mundo expurgado de armas nucleares com que Obama nos acena não passasse de um "sonho" também? No entanto, embora o sonho de Luther King tenha demorado para tomar forma, ele se materializa justamente com a chegada de Obama ao poder. Os sonhos levam tempo para se materializar.

Assim, seja graças a Obama ou a Kim, a questão nuclear assombra o horizonte desse começo de reinado. Obama se vê confrontado por duas figuras dominantes daquele "eixo do mal" que tanto atormentava seu antecessor, George W. Bush - a Coreia do Norte e o Irã.

Obama esforça-se para abrir um diálogo com o Irã e juntar todas as boas vontades, incluindo a da Turquia, para reatar os laços com Teerã. Mas, à mão estendida e aos sorrisos tão encantadores, o Irã não respondeu com igual generosidade.

Pyongyang é um dos nós essenciais desse enorme "mercado da proliferação" que se constituiu desde há alguns anos. Assim como se fala de uma globalização econômica que iria nos trazer a felicidade - que, por enquanto, nos deixa melancólicos -, pode-se falar de uma globalização nuclear. E no centro da tela, no centro dessa globalização, está Pyongyang.

Em fins dos anos 70, cientistas soviéticos brilhantes ajudavam a Coreia do Norte. Nessa época, Moscou entregou mísseis táticos a Pyongyang. Com o fim da URSS, os russos começaram a vigiar os conselheiros soviéticos dos norte-coreanos. A China também destacou alguns "cérebros" para Pyongyang. Em seguida, veio a era do doutor Abdul Q. Khan, o genial cientista paquistanês que é o pai da bomba do Paquistão.

Seria preciso somar centenas de filmes de James Bond e alguns romances de John le Carré para atingir um mesmo grau de complexidade e sombras que cerca o programa nuclear . É por isso que, sempre perseguindo o humilde e rude trabalho diplomático, não é inútil que uma grande voz, a de Obama, convoque o mundo para o "sonho" de um mundo desembaraçado da peste nuclear

sábado, 4 de abril de 2009

UMA CATÁSTROFE FINANCEIRA?

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UMA CATÁSTROFE FINANCEIRA?

Clóvis Cavalcanti
Economista ecológico e pesquisador social
clovis.cavalcanti@yahoo.com.br

No dia 3.10.05, um amigo meu, economista-chefe de gestão de risco no Brasil de importante banco multinacional, escreveu-me e-mail desesperado. Perguntava qual seria “a menor derrocada do sistema [financeiro] inteiro que nos permitirá caminhar novamente e não cair de vez”. E consultava: “Quanto tempo você acha que nós temos?”. Acrescia: “Aqui, do lado do mercado financeiro, não dá para ficar menos assustado ... tudo está dependente da loucura insana dos Estados Unidos ... A falência financeira dos Estados Unidos só poderá ser escamoteada no máximo por uns dois ou três anos”. Concluía: “É de aterrorizar qualquer ser pensante, não é mesmo?”. Casualmente, há poucos dias, encontrei a mensagem, que eu imprimi ao receber. Verifico agora a precisão do cálculo de meu amigo: entre outubro de 2007 e outubro de 2008, os EUA quebraram. Sobre isso, Alan Greenspan, ex-banqueiro central todo-poderoso dos EUA em 1987-2006, escreveu na revista britânica The Economist de 20.12.08: “A intermediação financeira global está quebrada”. Isso aconteceu depois da falência do Lehman Brothers no dia 15.9.08, momento em que a atividade econômica financiada pelo crédito bancário cessou virtualmente de existir. Ao mesmo tempo, um valor de bolsa de 30 trilhões de dólares foi varrido do mapa, sumiu. Só se pode concluir que o caso é de uma catástrofe financeira terrível.
O estrategista financeiro global David M. Smick, em artigo no New York Times de 10.3.09, escreveu: “Não há soluções para a crise dos bancos sem riscos políticos e financeiros extraordinários”. Nos seus cálculos, o verdadeiro valor de mercado dos ativos tóxicos dos bancos americanos (“a coisa horrorosa que precisa ser removida dos balanços”) vale entre 5 e 30 por cento do que custam efetivamente. Para que permaneçam solventes (em condições de pagar seus compromissos), contudo, os bancos falam que é preciso que esse valor seja de 50 a 60 por cento. Ou seja, simplesmente, o sistema bancário estadunidense requer dois trilhões de dólares de socorro do contribuinte, além da montanha de dinheiro que já recebeu. Para não se usar o dinheiro público, a solução seria estatizar agora os bancos (“nationalize”, em inglês; ou, literalmente, “nacionalizar”) para reprivatizá-los mais tarde. Esta saída tem o perigo de se ter que cair na “rede potencialmente letal” dos instrumentos de seguro de papéis (derivativos) chamados “credit default swaps”. Ninguém sabe o que há aí nesse verdadeiro buraco negro. Mexer nele pode desencadear um terremoto financeiro inimaginável. Como pode não acontecer nada. Essa realidade cria um ar de total incerteza. Daí por que o secretário do Tesouro americano, Tim Geithner, está adotando “um approach tríplice”: demorar, demorar, demorar, na esperança de que alguém surja com uma saída confiável – segundo Smick.
Tristemente, os papéis derivativos tornaram-se os senhores do sistema financeiro. Segundo os operadores do mercado, ao desmontar um grande banco – o que teria que ser feito com a estatização – o mercado totalmente não regulado desses títulos ficaria transtornado, “com conseqüências financeiras globais catastróficas”, no dizer de Smick. Ou não, pois, no caso, singram-se mares ignotos, conforme esse conhecedor profundo do mercado. Sua ilação: “Geithner tem razões para morrer de medo”. Ele fez parte da equipe de seu predecessor no Tesouro, a qual subestimou o efeito de contágio devastador do colapso do Lehman Brohers, responsável pela crise nas suas gigantescas proporções atuais. E foi um banco só. Imaginem se fossem vários, como o Citigroup ou Bank of America. Os derivativos financeiros globais, não regulamentados, ascendem a 40 trilhões de dólares (dois terços do PIB do planeta). É para deixar qualquer um assustado. Mas uma tribo da Amazônia, ou mesmo um sertanejo nordestino, em seu pedacinho de terra, não teria nada a temer. Benefício da não-globalização?

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Textos que devem ser lidos, especialmente pelos meus colegas economistas

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Textos que devem ser lidos, especialmente pelos meus colegas economistas:

Prosperity without a growth

The Price is not Right

Esse texto segue a linha de vários outros (Managing without Growth, David Korten, Kenneth Boulding, Limits of Growth do Grupo Meadows do MIT, entre outras contribuições de mais de cinco décadas). A matéria "The Folly of Growth" da News Scientist trouxe revelações importantes. Os países ricos já teriam entrado em colapso se além de seus territórios não existissem mais nenhum nenhum país para continuarem sugando recursos da natureza que esgotaram nas suas próprias fronteiras. E sugam a custo zero: transformar a Amazônia e o Cerrado em monoculturas para exportação tem custo zero.

Sustentabilidade passa necessariamente pela mudança de paradigma, algo que ainda não foi possível de ser endereçado, justamente porque a academia se nega a reconhecer a dependência do sistema econômico em relação ao meio ambiente. Pior, no nosso campo de atuação, continua prevalecendo a visão de total separação entre economia e meio ambiente. A economia não pode ser maior que o planeta, a tecnologia ajuda e precisa ajudar, mas não vai revogar as leis da física. Quando esse assunto chega até um economista neoclássico a resposta é sempre a mesma: "Meio ambiente não tem nada a ver com economia."

Será? Tudo indica que não. Por ventura foste tu que deste lei à luz da manhã? - pergunta Deus a Jó. Os físicos fazem a mesma pergunta há mais de 50 anos e Nicholas Georgescu-Roegen (1906-1994) levantou o problema da economia neoclássica e embora sua crítica nunca tenha sido refutada resolveram ignorá-lo. Acho que vale a pena começarmos a pensar cada vez mais nisso, antes que seja tarde demais, pois isso não está sendo dito por um bando de ignorantes e sim pelos maiores cientistas da Terra: não é o planeta que está ameaçado, pois nem fazemos cócegas a ele. Quem está ameaçado somos nós e por nossa visão simplista do mundo sócio-econômico que inventamos sem paralelo algum com a realidade.

Abraço

Hugo

Colaboradores